segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Educação Integral: Instrumento de desenvolvimento e autonomia, por Neliane Cunha


Neliane Cunha*

A Educação Integral, em seus aspectos pedagógicos e sociais, vai além do conceito de escola em tempo integral. Deve-se considerar a amplitude que a Educação Integral traz tanto para o trabalho pedagógico, que visa o desenvolvimento de crianças e jovens, quanto para a sociedade, vindo ao encontro da concepção progressista da educação, numa tendência libertadora que promove o caráter abrangente da escola, vinculando-a à luta e organização de classe, onde também a autonomia das mulheres no mundo do trabalho é imprescindível para todas e todos.

O debate sobre Educação Integral no sistema público de ensino do Brasil tem sua origem em 1932, tendo como referência Anísio Teixeira, considerado como o principal idealizador das grandes mudanças que marcaram a educação brasileira, pioneiro da escola pública em todos os níveis e fundador da Escola Parque. Essa proposta tem como marco legal a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que aponta a Educação Integral como um aumento progressivo da jornada escolar, valorizando as iniciativas educacionais extra-escolares e a vida em sociedade.

Em seus aspectos pedagógicos a Educação Integral prevê melhorias nos quadros de reprovação, com redução do fracasso escolar; propicia a construção coletiva e o constante acompanhamento do Projeto Político Pedagógico; traz novas abordagens para o trabalho de educadoras e educadores, promovendo transformações curriculares, das diversas ações e da avaliação. Esses resultados visam a reorganização do tempo e espaço no ambiente escolar, a formação profissional, a articulação entre os diferentes saberes e a relação entre escola e comunidade, além de estarem intrinsecamente ligados ao caráter social da Educação Integral, reconhecida aqui como um instrumento de valorização da escola pública, gratuita e de qualidade para todas e todos, concretizando o que sintetiza a Constituição Federal, em seu artigo 205: “A Educação, direito de todas e todos, dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”

Além da valorização da escola pública e do envolvimento de toda a comunidade escolar, enquanto aspecto social, a política de Educação Integral promove a autonomia da mulher trabalhadora. Essa autonomia econômica deve ser entendida com uma característica para além da questão financeira, pois aí também está contemplado o acesso à segurança social e serviços públicos, onde o salário não é considerado a única fonte de empoderamento das mulheres. É preciso rediscutir o modelo de sociedade patriarcal, onde mulheres sempre foram responsabilizadas pelo trabalho reprodutivo e de cuidados, enquanto aos homens foi atribuído o trabalho produtivo e o controle. Para romper essa realidade é indispensável a inclusão, a permanência e a valorização das mulheres no mundo do trabalho.

A Educação Integral, assim entendida, é instrumento para desenvolvimento e proteção de crianças e jovens, autonomia das mulheres e transformação da sociedade que venha compreender, como Anísio Teixeira, que "numa democracia, nenhuma obra supera a de educação”


* Educadora, Pedagoga e Diretora do Sinpro-DF, na Secretaria de Assuntos e Políticas para Mulheres

2 comentários:

  1. Mulheres, muito prazer! Achei muito legal a ideia do blog. Sou blogueira, feminista e petista. Quando quiserem dá uma olhada no meu blog, um deles é: http://matizesfeministas.blogspot.com
    Serão muito bem-vindas. Um abração!

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  2. Neliane esse espaço é muito importante não apenas para as mulheres como para homens, educadores e lutadores. Há uma aproximação entre as várias lutas: mulheres, negros, negras, sem terra, homossexuais, ciganos (as) etc. Penso que a base fundante de todas as lutas é o Direito Humano. Todos os segmentos sociais que primam nesse pressuposto enxergam as especificidades como de interesse de todos (as). Um negro, por exemplo, pode somar à luta das mulheres e essas compartilhar das lutas das mulheres negras e assim por diante.
    Ao tratar da Educação Integral na perspectiva da formação da mulher, cabe lembrar-se da abrangência que essa categoria representa no contexto educativo, principalmente se tomarmos por base a dinâmica das relações de poder que exige uma formação consistente para poder enfrentar os vários desafios perpetrados por estruturas de poder e ideologias dominantes e opressoras.
    Educar integralmente tem a ver com a totalidade, de maneira que não há espaço para o fragmento. A dimensão fragmentária do processo educativo tem reduzido o ensino e a própria educação ao mero ato de transmissão de conteúdos, o que é pior: muitas vezes a transmissão reproduz apenas o modus vivindis de uma sociedade capitalista.
    Pensar uma educação integral é, portanto, desafiar o sistema gerador de fragmentações e vivenciar um novo jeito de ser pessoa no mundo. Essa perspectiva educativa integral, pensada sob a lógica emancipatória rompe com tendências que massificam e produzem objetivação do sujeito. Mas para reconfigurar uma tendência de ensino\educação exige uma vontade\ação de todos os sujeitos educativos e de saberes, bem como dos sujeitos institucionais.
    Ao lembrar a necessidade de enfrentar a prática patriarcal, precisamos também saber em quais circunstâncias o patriarcado se situa em sociedades contemporâneas. É bem verdade que há novos ajustes e novas feições do patriarcado que já é caduco, o que data de 3.100 a.C. prova que a luta contra essa tendência deve ser permanente e com todos os instrumentos possíveis.
    O patriarcado, como se sabe, atinge não apenas a família, mas a cultura, o Estado, as religiosidades e outras instituições sociais. Penso que a luta das mulheres irrompe na história como uma luta da humanidade, por essa razão todos devem unir na busca de melhores condições de vida, o que implica uma solidariedade planetária e não apenas localizada.
    Ao perceber que a construção do sujeito é histórica fazemos da educação um modo de vida capaz de superar o patriarcalismo, o femicídio, o sexismo, o machismo e todas as formas correlatas de violência contra a mulher, daí a grande relevância do pensamento de Simone de Beauvoir “não se nasce mulher, torna-se mulher”. O tornar-se coloca todo sujeito no devir, sem tempo definido e sem circunstância determinada. No entanto o tornar-se deve ser, no nível da utopia, vida renovada no espírito (epistemologia) e no corpo (sensibilidades). Vamos em frente pensando e lutando, a fim de que possamos renovar nosso espírito e conquistar espaços de liberdade, respeitabilidade e realização.
    Sucesso e luz!
    Cristino C. Rocha é professor da Secretaria de Estado de Educação do DF.

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